CBDCs: a tentativa dos bancos centrais e governos de não perder terreno frente às criptomoedas.
Objetivos principais das CBDCs
- Melhorar o sistema de pagamentos.
- Substituir o dinheiro em espécie por dinheiro digital.
- Aperfeiçoar a política monetária.
- Evitar crises bancárias.
- Alcançar uma maior inclusão no sistema financeiro de um país.
Por que surgem as CBDCs?
Com o surgimento das criptomoedas, os bancos centrais e os governos se sentiram ameaçados. Eles veem um risco de perder o controle absoluto que exercem sobre o que é mais valioso: o dinheiro. Além disso, alguns usuários começam a se cansar dos bancos, como já aconteceu em diferentes ocasiões ao longo da história desde que há registros da existência dos mesmos, e tentam buscar outras opções para depositar suas economias.
Por sua vez, os governos estão percebendo que "seu dinheiro”, o dinheiro fiduciário, está perdendo o interesse dos cidadãos, e que existe um grupo de usuários que, embora ainda não tenham decidido apostar nas criptomoedas (por desconhecimento, desconfiança na tecnologia blockchain ou por falta de legislação no campo das criptomoedas), sentem-se atraídos por elas. O fato de que um banco central ofereça um tipo de dinheiro fiduciário digital pode atrair esses indivíduos que buscam investir em um dinheiro confiável, mas digital.
No entanto, além do interesse em torno das CBDCs, elas são um projeto que ainda precisa se consolidar. Com exceção de casos particulares (já em fases avançadas de teste piloto) - como na Nigéria, Bahamas, Uruguai, Suécia - na maioria dos países ainda persistem dúvidas sobre como esses ativos serão implementados. Algo compreensível, considerando as diferentes implicações das CBDCs, que vão desde o tecnológico até o social (privacidade do usuário).
O que é uma CBDC?
CBDC é a sigla para Central Bank Digital Currency, em português: moeda digital do banco central. É a alternativa às criptomoedas que os governos, por meio de seus bancos centrais, oferecem para tentar solucionar a lacuna aberta pela desconfiança dos usuários e a chegada dos criptoativos. No entanto, é importante ressaltar que as CBDCs não são criptoativos; são moedas digitais que não possuem as mesmas características. As diferenças entre ambas podem ser resumidas na seguinte tabela:
Criptomoeda | CBDC | |
Criação | Empresas, particulares e organizações públicas e privadas com capacidade para criá-las | Bancos Centrais/governos |
Estrutura | Descentralizada | Centralizada |
Acessibilidade | Aberta | Controlada pelo emissor (governos/bancos centrais) |
Privacidade | Alta | Nula |
Volatilidade | Elevada | Nula |
Usabilidade | Ilimitada | Pode-se limitar |
Código | Aberto | Fechado |
Quais os objetivos das CBDCs?
Além de oferecer uma alternativa aos criptoativos disponíveis no mercado, os bancos centrais apresentam suas CBDCs com uma série de características e objetivos.
E não devemos esquecer que, na maior parte dos casos, essas moedas digitais ainda estão em processo de criação:
- Melhorar o sistema de pagamentos. Possibilidade de realizar pagamentos 24/7 com maior rapidez. Hoje em dia, algumas transações demoram dias para serem executadas; com esse tipo de moeda digital, pretende-se que todas as operações sejam imediatas.
- Substituir o dinheiro em espécie por dinheiro digital. Isso economizaria todo o processo de produção do dinheiro físico e contribuiria para a sustentabilidade do planeta.
- Melhorar a política monetária. Os bancos centrais terão um controle mais rigoroso da moeda digital em circulação, melhorando o sistema monetário, o que pode facilitar a gestão de cenários de inflação.
- Evitar crises bancárias. Graças às suas características, podem ajudar a reduzir as vulnerabilidades de um sistema bancário, como o dano causado por um êxodo bancário por parte dos usuários.
- Maior inclusão no sistema financeiro de um país. Com essa opção de moedas digitais, seria possível incluir muitas pessoas que são rejeitadas pelo sistema bancário tradicional, já que teriam acesso às CBDCs simplesmente com carteiras digitais.
Que tecnologia utilizam as CBDCs?
Atualmente, os bancos centrais, para desenvolver os projetos das CBDCs, estão trabalhando com tecnologias blockchain e DLT (Distributed Ledger Technology, ou Tecnologia de Livro Distribuído em português).
Sabe-se que a blockchain oferece uma grande versatilidade e interoperabilidade entre as diferentes criptomoedas existentes, e isso é um ponto importante para os bancos centrais, que buscam sistemas mais robustos para operar.
Por sua vez, a tecnologia DLT é um sistema de dados distribuído, onde não existe uma unidade central que controle tudo.
À primeira vista, poderíamos pensar que DLT e blockchain são a mesma coisa, mas não é exatamente assim. De forma geral, podemos dizer que a blockchain pertence ao grupo das tecnologias DLT. Todas as tecnologias DLT utilizam protocolos P2P, que garantem uma imutabilidade e segurança elevadas.
A diferença fundamental entre a blockchain e outras tecnologias DLT é que nem todas as tecnologias DLT operam com blocos de dados, como faz a blockchain.
Cada banco central escolherá, portanto, a tecnologia que melhor se adapte aos seus objetivos.
Por outro lado, as CBDCs adotarão o padrão ISO 20022, que fornecerá uma linguagem comum para realizar pagamentos eletrônicos com essas novas moedas digitais. Este será o padrão adotado pelos bancos centrais no desenvolvimento dessas moedas.
Quais desvantagens têm as CBDCs?
Todos os projetos têm seus pontos positivos e, às vezes, suas desvantagens. As CBDCs apresentam uma série de desvantagens que os usuários também devem conhecer. A seguir, listamos as mais importantes:
- Centralização. O banco central terá controle absoluto sobre uma CBDC. Decidirá quem pode participar do projeto e que tipo de transações podem ser realizadas, entre outras questões.
- Não há anonimato. As informações dos participantes em cada transação serão registradas pelo banco central emissor, de maneira que não existe anonimato com esse tipo de moeda digital.
- Curva de aprendizado. Os usuários que optarem por utilizar esse tipo de moeda digital precisam, assim como com as criptomoedas, de uma formação inicial para entender como utilizá-las, algo que não é necessário com o dinheiro fiduciário.
Quais exemplos existem de CBDCs?
Atualmente, existem muitos projetos de moedas digitais, praticamente todos em desenvolvimento. A seguir, detalhamos brevemente quatro projetos de CBDCs, mas se você estiver curioso sobre como outras iniciativas estão sendo desenvolvidas, pode conferir neste site: CBDC Tracker.
Eurochain
Trata-se da CBDC criada pelo Banco Central Europeu (BCE), que ainda está em fase de estudo. Este projeto foi apresentado pela primeira vez em dezembro de 2019, quando foi publicado um artigo sobre o mesmo. Seu objetivo principal é converter o euro em uma moeda digital. A tecnologia utilizada neste caso é a DLT, especificamente o Corda.
É uma moeda digital que ajudará, entre outras coisas, a combater a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. Embora uma das desvantagens das CBDCs seja o anonimato, o Eurochain oferece uma série de vantagens para proteger a privacidade, embora apenas até certo ponto; as transações não são privadas 100%.
Fabio Panetta, membro da diretoria do BCE, declarou em maio de 2022 que a moeda digital europeia estará pronta para ser lançada no mercado em aproximadamente quatro anos.
DCEP (Yuan Digital da China)
Trata-se da moeda digital criada pelo banco central chinês. Em 2014, a China começou a desenvolver sua moeda digital DCEP (Digital Currency Electronic Payment, em inglês). Entre 2020 e 2021, foram realizados testes com alguns protótipos. Em 2022, foram realizados, entre outros, ensaios durante os Jogos Olímpicos de Inverno, que não só serviram para continuar avaliando o projeto, mas também para apresentar a moeda digital à comunidade global. Em janeiro de 2022, o governo chinês permitiu o uso de um aplicativo para utilizar esse yuan digital, e nove bancos ofereceram carteiras digitais aos seus clientes para esse fim.
O objetivo fundamental dessa moeda digital é vincular toda a massa de sua moeda fiduciária Renminbi (RMB) ou Yuan 1:1 com DCEP, tentando aumentar sua circulação e posicioná-la no cenário internacional.
A tecnologia utilizada pelo DCEP é a blockchain. No entanto, trata-se de uma blockchain privada, onde os principais nós são controlados pelo banco central chinês e uma série de nós secundários estão nas mãos de empresas ou bancos privados. Quanto aos demais detalhes técnicos, não se sabe muito mais. A China é muito reservada ao divulgar qualquer informação a respeito.
O banco central chinês comentou que todas as transações estarão controladas, portanto, o anonimato e a privacidade não existirão, embora os dados não sejam divulgados a terceiros. Este é um dos problemas enfrentados por esse projeto: o controle excessivo que o governo chinês sempre exerceu sobre seus cidadãos, o que faz com que muitos investidores desconfie dessa moeda digital, que sem dúvida é um dos maiores projetos nesse sentido.
Dólar Digital (FEDcoin)
O Federal Reserve dos Estados Unidos está atualmente estudando a possibilidade de desenvolver uma moeda digital. Dado o aumento do número de países que estão trabalhando em suas próprias CBDCs, os Estados Unidos não ficariam para trás, e atualmente estão investigando essa opção, que sem dúvida se tornará realidade em breve. O maior problema que o projeto enfrenta é que a legislação do país terá que ser modificada para se adaptar a essa nova tecnologia.
Tudo começou em 2019, quando uma equipe do Conselho do Federal Reserve começou a desenvolver um projeto para a realização de pagamentos eletrônicos baseados na tecnologia DLT. Em janeiro de 2022, o Federal Reserve publicou um documento com um estudo aprofundado sobre as CBDCs, incluindo as implicações de adotá-las, riscos e benefícios. No final de março de 2022, foi apresentada uma proposta legislativa no Congresso para introduzir o dólar digital, emitido pelo Departamento do Tesouro, no sistema de pagamento dos EUA utilizando a tecnologia blockchain.
Real Digital
O real digital é um projeto, em fase de desenvolvimento, liderado pelo Banco Central do Brasil, que busca a criação de uma CBDC. Esse novo ativo digital será respaldado pelo Sistema de Transferências de Reserva (STR), um sistema de pagamentos fiduciários. Em 24 de maio de 2021, o banco central brasileiro publicou em seu site os objetivos da criação de sua própria CBDC. Foram os primeiros passos para a realização do projeto.
Em novembro de 2021, foi lançado o projeto "Lift Challenge", cujo objetivo é a colaboração entre diferentes entidades para a criação do real digital. Em seu site, é possível ver a quantidade de empresas privadas, inclusive de fora do Brasil, envolvidas nessa iniciativa.
O presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, anunciou em abril de 2022 que estava sendo desenvolvido um piloto que, para o segundo semestre do ano, permitiria o início da utilização dessa nova CBDC, porém enfrentaram problemas de privacidade que fossem compatíveis com a legislação do país. Dessa forma, o Brasil se tornou o primeiro país da América do Sul a realizar um piloto de uma CBDC. Seu lançamento não tem mais data prevista.
Outros projetos Latino-Americanos: Chile, Uruguai e México
O Banco Central do México informou que espera lançar uma CBDC em 2025. Além dessa data, a instituição não detalhou as características ou o plano de desenvolvimento da moeda. A única coisa que o banco central mexicano reiterou é que o interesse em CBDCs não deve ser interpretado como uma disposição maior em relação às criptomoedas.
No caso do Chile, a autoridade financeira esperava lançar uma CBDC até o final de 2022 ou no início de 2023 (o plano original era ter a moeda desde o início de 2022, mas o banco central chileno adiou o lançamento). De acordo com relatórios da imprensa chilena, o projeto continua em andamento, mas sob novos processos de análise.
A situação é diferente para o Uruguai, cujo projeto de CBDC (chamado e-Peso) já está em uma fase avançada de desenvolvimento, incluindo um teste piloto que forneceu algumas conclusões. No entanto, o Banco Central do Uruguai não definiu uma data oficial para o lançamento em massa do e-Peso - que não utiliza blockchain, mas sim uma tecnologia centralizada. O projeto parece estar inativo no momento da publicação.
Por sua vez, a Argentina está em processo de investigação sobre o tema das CBDCs; o desenvolvimento de uma moeda digital no país ainda parece bastante distante.